Ana Sabiá diz que se encanta com as infinitas possibilidades de mundo que descobre, mas na verdade é mundo que se encanta com o olhar de Ana Sabiá.  A fotografia  é um dos meios que utiliza para seus vôos de investigação. E esse encantamento chega até nós através de umas série de imagens de auto-representação que flutuam nas fronteiras entre o documentário e a ficção.  Ana cria, recria, reinventa a sua melancolia. Neste jogo de Paciência, ela nos liberta do confinamento. Assistimos atentos, capturados pela incessante mutação do seu espaço.

Diariamente a sua câmera registra uma imensa capacidade de abstração. E já não sabemos mais se estamos diante de fotografias ou esculturas que nos confrontam com a questão identitária do feminino, o corpo, a ilusão. Ana nos envolve com seu tecidos e nos embarca nesta verdadeira viagem pelas tramas da sua liberdade criativa. E então, de repente, nos vemos nesses espelhos multifacetados que reproduzem reflexos caleidoscópicos.

O Iandé convidou a  artista Ana Sabiá para compartilhar aqui sua vivência fotográfica da sua quarentena em Florianópolis :

“Eu sempre gostei de estar em minha casa. Mas uma coisa é ficar em casa por escolha e outra coisa é ficar em casa por restrição e isolamento em consequência da pandemia da Covid-19. Os sentidos aí se afloram por outras especificidades e condições.
Tanto tempo dentro de casa fez com que eu percebesse meu espaço doméstico a partir de outras possibilidades. Construí divisórias e paredes a partir de lençóis e, como por mágica, havia dentro da minha casa um outro mundo inteiramente inédito. Desde então esse “universo paralelo” tem sido o palco de fabulação fotográfica na série “Jogo de Paciência” onde busco amalgamar antagonismos entre a realidade ficcional e a ficção realista em referência direta à estética surrealista. A começar pela escolha na fotografia em preto, branco e uma considerável gama de cinzas, evidência que demarca a supressão da realidade colorida visível aos olhos, remete aos primórdios da fotografia mas suspende a temporalidade linear. O cenário delimita um palco surreal para as personagens e os objetos de afeto. Por vezes o “fundo infinito” afirma o deslocamento espacial onde tudo está suspenso: não há paredes, chão ou teto e os elementos buscam algum rearranjo, emoldurados pela brancura amarrotada.”

Ana Sabiá (SP, 1978) é artista visual, fotógrafa e pesquisadora independente. Doutora em Artes Visuais pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Atualmente reside em Florianópolis (SC) e desenvolve pesquisas abrangendo corpo, surrealismo e auto-representação como estratégia de problematização política e feminina através da fotografia autoral. Participa ativamente da cena fotográfica contemporânea de exposições, palestras, mostras e festivais em todo o território nacional. Portfolio disponível no seu site. www.anasabia.com